ISSN 0798 1015

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Vol. 40 (Nº 26) Ano 2019. Pág. 29

Educação física na educação infantil: um estudo das práticas pedagógicas de professores de educação física

Physical education in children education: a study about pedagogical practices at teachers of physical education

MELO, Amanda F. 1 e VANZUITA, Alexandre 2

Recebido: 04/05/2019 • Aprovado: 27/07/2019 • Publicado 29/07/2019


Conteúdo

1. Introdução

2. Metodologia

3. Práticas pedagógicas da educação física na educação infantil: reflexões a partir do estado do conhecimento

4. Educação física na educação infantil

5. As práticas pedagógicas dos professores de educação física na educação infantil no bairro cidade nova em Itajaí/SC

6. Conclusões

Referências bibliográficas


RESUMO:

Esta pesquisa tem como objetivo analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física na Educação Infantil do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC. Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa, com caráter exploratório, em que utilizou-se como instrumento de coleta de dados as entrevistas estruturadas. Com o desenvolvimento desta pesquisa, concluiu-se que não se pode definir que exista uma única prática pedagógica, mas que há práticas pedagógicas, que se articulam entre si, mas não se constituem como homogêneas.
Palavras chiave: Educação Física, Educação Infantil, Práticas Pedagógicas

ABSTRACT:

This research aims to analyze the pedagogical practices developed by Physical Education teachers in Early Childhood Education in the Cidade Nova neighborhood in Itajaí / SC. It is a qualitative research, with an exploratory character, in which structured interviews were used as a data collection instrument. With the development of this research, it was concluded that it is not possible to define that there is a single pedagogical practice, but that there are pedagogical practices, that are articulated among themselves, but are not constituted as homogeneous.
Keywords: Keywords: Physical

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1. Introdução

A área da Educação Física no contexto da Educação Infantil é um campo de intervenção e de pesquisa recente (MOREIRA, 2012; QUARANTA, 2015; PERINI, 2016). Por tanto, surge o interesse em investigar formulando-se o seguinte o questionamento: quais práticas pedagógicas são desenvolvidas por professores de Educação Física em turmas de Educação Infantil?. À vista disso, a presente investigação tem como objetivo analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física na Educação Infantil do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC. Para atingir tal objetivo, elencou-se três objetivos específicos: a) levantar o perfil profissional dos professores entrevistados; b) verificar quais conteúdos os professores de Educação Física na Educação Infantil do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC desenvolvem; e c) identificar as práticas pedagógicas de professores de Educação Física na Educação Infantil do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC.

Visando produzir as respostas para deste estudo, esta pesquisa caracteriza-se como qualitativa; de caráter exploratório, em relação à abordagem e aos objetivos; e, descritivo-analítica com referência aos procedimentos técnicos de análise de dados.

De modo a esclarecer o leitor, este artigo encontra-se estruturado em tópicos, sendo este a introdução; o tópico 2 a descrição do percurso metodológico; o tópico 3 o estado de conhecimento no Banco de Teses e Dissertações da CAPES acerca das produções científicas relacionadas ao tema desta pesquisa; no tópico 4 foram tratadas as reflexões sobre a Educação Física na Educação Infantil e os conceitos de práticas pedagógicas que filia-se esta investigação; no tópico 5 tem-se a análise dos dados empíricos produzidos por meio de entrevistas; e, por fim, apresenta-se as considerações finais com base no estudo realizado.

2. Metodologia

Com a intenção de analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física na Educação Infantil do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC, adotou-se nesta investigação as características da pesquisa exploratória, de abordagem qualitativa. Conforme Minayo (1993), esta abordagem de pesquisa aproxima as experiências vividas e o cotidiano dos sujeitos de pesquisa. À vista disso, visando alcançar o objetivo proposto, realizou-se um estado de conhecimento, em que segundo Morosini (2015, p. 102) constitui-se em uma:

[...] identificação, registro, categorização que levem à reflexão e síntese sobre a produção científica de uma determinada área, em um determinado espaço de tempo, congregando periódicos, teses, dissertações e livros sobre uma temática específica.

O estado de conhecimento teve como principal banco de dados o Banco de Teses e Dissertações da CAPES, entre o período de 2012 a 2016, disponíveis na Plataforma Sucupira. O intuito deste procedimento foi apresentar as produções acadêmicas relacionadas mais diretamente ao tema que se propõe investigar, de modo a sustentar o percurso teórico-metodológico e orientar as reflexões teóricas do estudo.

Considerando que a pesquisa objetiva analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física na Educação Infantil, elaborou-se um roteiro de entrevista estruturado, que foram realizados com 10 professores de Educação Física que atuam nos Centros de Educação Infantil (C.E.I) do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC. Os dados empíricos levantados foram analisados de maneira descritivo-analítica.

Vale mencionar que no bairro Cidade Nova em Itajaí/SC há 10 C.E.I, com um total de 13 professores de Educação Física. Entretanto, para o desenvolvimento desta pesquisa selecionou-se um professor de Educação Física de cada C.E.I, em que o critério de seleção baseou-se no maior tempo de atuação na referida instituição.

Tendo em vista que esta pesquisa teve o envolvimento com seres humanos, submeteu-se o projeto de pesquisa ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEPSH) do Instituto Federal Catarinense – Campus Camboriú. O mesmo foi aprovado em maio de 2017, por meio do Parecer nº 2.110.965 com o registro CAAE 68683817.1.0000.8049. Tal procedimento exigiu a concordância dos professores participantes, tanto na adesão a esta pesquisa como também de autorizarem a divulgação dos dados para finalidades acadêmicas, formalizada por meio da assinatura de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecimento para a participação em atividades de pesquisa. Considerando o percurso metodológico descrito e realizado, no tópico a seguir, apresenta-se o estado de conhecimento.

3. Práticas pedagógicas da educação física na educação infantil: reflexões a partir do estado do conhecimento

Conforme já mencionado, esse estado de conhecimento se constitui no levantamento e análises das produções teóricas disponíveis on-line no Banco de Teses e Dissertações da CAPES, realizadas entre os anos de 2012 a 2016 referentes às práticas pedagógicas dos professores de Educação Física na Educação Infantil. Esses estudos foram analisados no intuito de apresentar as produções acadêmicas relacionadas ao tema que se propõe analisar, de modo a sustentar o percurso teórico-metodológico, mas também respaldar as reflexões teóricas aqui realizadas.

Para o desenvolvimento das análises utilizou-se como critério de seleção e rejeição a leitura do resumo da pesquisa dos trabalhos disponíveis na Plataforma Sucupira, no propósito de identificar os estudos que se relacionavam com a temática a ser pesquisada. As análises dos estudos selecionados procederam-se de forma descritivo-analítica, em que se considerou como relevante nos resumos e na introdução das produções os seguintes aspectos: abordagens de pesquisa, os objetivos, os sujeitos de pesquisa, o caminho metodológico, os instrumentos para a coleta de dados e as considerações finais.

De modo a iniciar a busca pelas produções acadêmicas existentes utilizou-se, no primeiro momento, dos descritores: “práticas pedagógicas” “educação física” “educação infantil”. Dada a combinação destes descritores com aspas obteve-se 27.141 estudos. Devido à abrangência do mesmo, e, o tempo limitado para a realização da pesquisa não foi possível realizar a descrição e análise destes estudos com tais descritores.

Na finalidade de selecionar com mais precisão os estudos que se relacionavam com a temática, restringiu-se a busca com o descritor “práticas pedagógicas educação física”, no qual encontrou-se 3 estudos, dos quais nenhum se relacionava diretamente com a temática, pois os mesmos voltavam-se para as práticas pedagógicas dos professores de Educação Física no Ensino Fundamental e no Ensino Técnico Profissional.

Já com o descritor "educação física educação infantil", obteve-se 19 estudos, entre dissertações e teses no período analisado. Destes, 4 produções (3 dissertações de mestrado e 1 tese de doutorado) são anteriores à criação da Plataforma Sucupira. Tendo em vista o critério de seleção, não foi possível realizar as análises destes, uma vez que não apresentavam o resumo de pesquisa disponível para a leitura. Contudo, dos 15 estudos disponíveis, 3 relacionavam-se de forma mais aproximada com a temática pesquisada, e estes foram selecionados para as nossas análises.

Com referência às 3 produções selecionadas, ambas pertencem a região sudeste e correspondem a dissertações de mestrado, cujos autores são: Moreira (2012), Quaranta (2015) e Perini (2016). Dos estudos analisados, todos adotam a abordagem de pesquisa qualitativa e utilizam as entrevistas como instrumento para a produção de dados. Tais estudos têm como foco a prática pedagógica a partir de documentos legais que norteiam a Educação Infantil, inserção e atuação profissional e saberes docentes. Diante do exposto, o propósito destas análises consiste em identificar no que essas produções se relacionam com a temática e problemática do presente estudo. 

A pesquisa intitulada “Referenciais Prescritos para a Educação Infantil: Diálogos com o Professor de Educação Física”, estuda os documentos oficiais norteadores da Educação Infantil, no intuito de identificar a concepção de Criança, Infância, Educação Infantil e Educação Física abordada nesses documentos (MOREIRA 2012). Além disso, este estudo visou analisar, através das falas dos professores de Educação Física, em que medida estes documentos influenciam no desenvolvimento de suas práticas pedagógicas nas instituições de Educação Infantil (MOREIRA, 2012).

A autora analisou os seguintes documentos: "Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil (2009), Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (1998), Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil (2006) e A Educação Infantil no Município de Vitória: um outro olhar (2006)" (MOREIRA, 2012, p. 10).

Para alcançar o objetivo proposto, o estudo de Moreira (2012) utilizou a abordagem teórico-metodológica autobiográfica, cujo instrumento de produção de dados foram as entrevistas narrativas, realizadas com sete professores de Educação Física que atuam na Educação Infantil, do município de Vitória/ES. De acordo com a autora, os professores participantes da pesquisa foram selecionados a partir da realização do Seminário de Práticas Pedagógicas em Educação Infantil, que ocorreu em Vitória/ES no ano de 2010 (MOREIRA, 2012).

A autora dividiu seu estudo em cinco capítulos, apresentando inicialmente as razões que a levaram a realizar esta pesquisa. Em seguida, faz a contextualização da escolha dos seus sujeitos de pesquisa, bem como a opção teórico-metodológica. No terceiro e quarto capítulos, a autora traz a reflexão da temática que se propõem a pesquisar, apontando os “[...] fundamentos pedagógicos contidos nos documentos e sua relação com a prática da Educação Física na educação infantil de Vitória/ES, a partir das mensagens discursivas captadas nas entrevistas narrativas realizadas com os professores de Educação Física”. Por fim, expõe alguns resultados alcançados com a realização do estudo, mencionando inclusive as lacunas apresentadas que poderão subsidiar o desenvolvimento de novos estudos (MOREIRA, 2012).

Entre as principais contribuições do estudo de Moreira (2012) pode-se mencionar que as concepções, conceitos e valores presentes nos documentos estudados se concretizam nas práticas dos professores de Educação Física na Educação Infantil. Conforme a autora, os documentos oficiais que mais contribuem com a prática educativa dos professores de Educação Física que atuam na Educação Infantil no município de Vitória/ES são: Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil e Educação Infantil: um outro olhar. Além disso, a autora menciona que pôde identificar que as práticas pedagógicas dos professores participantes da pesquisa se dão a partir da Cultura Corporal e em concordância com peculiaridades que constitui esta primeira etapa da Educação Básica (MOREIRA, 2012).

Nota-se que o estudo de Moreira (2012), apesar de ter como objeto de estudo as práticas pedagógicas dos professores de Educação Física na Educação Infantil, não menciona diretamente quais as práticas pedagógicas que estes professores desenvolvem, o que difere da pesquisa que se realiza, cujos dados empíricos serão expostos e analisados em seguida. Importa mencionar, no entanto, que a pesquisa de Moreira (2012) busca compreender em que medida as concepções e os princípios presentes nos documentos mencionados influenciam no desenvolvimento das práticas pedagógicas dos professores de Educação Física que atuam na primeira etapa da Educação Básica. 

Outra pesquisa tomada como referência para este estudo é a de Quaranta (2015), que teve como objetivo investigar como os professores de Educação Física percebem suas práticas pedagógicas na Educação Infantil em Escolas Públicas Municipais de Praia Grande/SP. Para identificar as dificuldades, dilemas e possibilidades que esses professores possuíam no desenvolvimento de sua prática pedagógica na Educação Infantil, o estudo abrangeu 23 professores de Educação Física que atuavam no ano de 2013 com crianças de 4 a 5 anos, matriculadas na pré-escola da rede municipal de ensino de Praia Grande/SP.

A pesquisa de abordagem qualitativa, utilizou como procedimento metodológico a hermenêutica-dialética, em que as análises dos dados ocorreram por meio da técnica de análise de conteúdo. A produção de dados se deu por meio da aplicação de questionários com 15 questões abertas, elaboradas a partir de quatro categorias: “formação, prática e possibilidades e dificuldades percebidas pelos professores em sua atuação com a Educação Infantil” (QUARANTA, 2015, p. 32). Os questionários foram aplicados durante uma reunião de Orientação Pedagógica Específica aos Professores de Educação Física. Além da aplicação dos questionários, a autora selecionou dois professores para realizar uma entrevista.

A pesquisa mencionada foi estruturada em 4 capítulos e está dividida em: “[...] pesquisa antes da pesquisa, pesquisa bibliográfica, aplicação e análise dos questionários, entrevista e análise dos dados”. No primeiro capítulo, a autora aborda sobre a Educação Física na Educação Infantil, apresentando os caminhos percorridos por essas duas áreas. No segundo capítulo, tem-se a indagação de quem deve ministrar as aulas de Educação Física na educação Infantil, pontuando as questões legais que norteiam a presença do professor de Educação Física na Educação Infantil bem como a escolha que o município de Praia Grande/SP fez. No capítulo metodológico, são apresentados os caminhos percorridos durante a pesquisa bem como as cinco etapas que a pesquisa está dividida. Com referência aos resultados e discussões, Quaranta (2015) expõe as categorias que desenvolveu para analisar seus dados, as quais foram: formação, condições institucionais e a prática pedagógica.

Ao finalizar seu estudo, a autora compreende que as dificuldades dos professores de Educação Física no desenvolvimento de suas aulas na Educação Infantil do Município de Praia Grande/SP envolvem a falta de espaço e materiais, mas principalmente, a formação inicial. Conforme a pesquisa, a formação inicial tem lacunas no que se refere ao conhecimento sobre o sujeito criança, bem como a preparação desses profissionais para ministrarem aula nessa etapa da Educação Básica, uma vez que a formação inicial não tem tratado como foco de estudo a Educação Infantil. Diante do apresentado, Quaranta (2015) coloca que as dificuldades encontradas por esses professores vêm sendo superadas por meio das trocas de experiências com outros professores, pesquisas e com o apoio do suporte técnico-pedagógico.

Com base no estudo, percebe-se que esta pesquisa apesar de mencionar a prática pedagógica dos professores, não informa diretamente quais práticas professores/crianças da Educação Infantil são desenvolvidas pelos, mas avança no sentido de apontar os desafios e impasses que os professores de Educação Física que atuam na Educação Infantil enfrentam para desenvolver seu trabalho. Percebe-se que parte desses desafios estão na própria formação inicial, que acaba sendo escassa no sentido de problematizar o conhecimento em relação ao sujeito criança e no que se refere ao método utilizado para a formação do professor.

Assim como Quaranta (2015) a presente pesquisa também é de cunho qualitativo e utiliza as entrevistas como processo de produção de dados. Vale ressaltar que o estudo de Quaranta (2015) ajuda a repensar os processos de formação inicial, visando contribuir com a busca de alternativas que possam contribuir na melhoria da qualificação dos percursos formativos dos professores de Educação Física que irão atuar ou atuam na Educação Infantil.

Perini (2016), por sua vez, utiliza em sua dissertação, a pesquisa de abordagem qualitativa, com caráter descritivo-interpretativo, lançando mão das entrevistas semiestruturadas como instrumento para a produção de dados. Além disso, a autora teve acesso a documentos pessoais referentes às práticas docentes dos professores participantes da pesquisa. Para análise dos dados empíricos, valeu-se da técnica de análise de conteúdo.

Como objetivo de estudo, a autora buscou identificar e analisar os saberes docentes dos professores de Educação Física na Educação Infantil no município de Serra/ES e sua concretização na prática pedagógica (PERINI, 2016). Para a seleção dos sujeitos da pesquisa, a autora considerou a subdivisão geopedagógica que o município de Serra/ES apresenta. Nesse sentido, optou por sortear dois professores de cada uma das seis regiões geopedagógicas, o que totalizou na participação de doze professores de Educação Física (PERINI, 2016).

Perini (2016) sistematiza sua pesquisa em sete capítulos. No primeiro, apresenta os motivos que a levaram a desenvolver o estudo. No segundo, a autora caracteriza seus procedimentos metodológicos, contextualizando a seleção dos sujeitos e o lugar que desenvolveu a pesquisa. No terceiro capítulo, a autora expõe sobre a inserção da Educação Física no campo da Educação Infantil no município de Serra/ES. No quarto capítulo, encontra-se a revisão de literatura acerca dos saberes docentes na formação de professores, com discussões voltadas para a área da Educação Física. No quinto e sexto capítulos, a autora analisa os dados, visando as “[...] problematizações específicas dos saberes docentes dos professores de Educação Física na educação infantil de Serra e sua materialização na prática pedagógica por via do currículo praticado, respectivamente” (PERINI, 2016, p. 23).

Em síntese, o estudo de Perini (2016) aponta que os saberes docentes são construídos na prática pedagógica por meio da interação e relação professor-aluno e o contexto sociocultural que estão inseridos. A autora pôde constatar ainda que os saberes das experiências - tanto de experiências docentes anteriores quanto de experiências que ocorrem na prática do contexto atual que estão inseridos – são potencializadores para a “[...] mobilização, construção e ressignificação dos saberes necessários para atuação do profissional de Educação Física na educação infantil de Serra” (PERINI, 2016, p. 8).

Diante do exposto, nota-se que o estudo de Perini (2016) é de sobremaneira relevante para esta pesquisa, uma vez que revela que os saberes pedagógicos são saberes fundamentais para o desenvolvimento de uma prática pedagógica coerente e instigante para os sujeitos. Assim, a contribuição da pesquisa de Perini (2016) está em apresentar que para o desenvolvimento da prática, além dos conhecimentos específicos da área, é necessário a ciência dos conhecimentos pedagógicos, de modo que as práticas desenvolvidas em sala estejam em conformidade com a realidade dos alunos (NEZ; SILVA, 2010).

Em seu estudo, Perini (2016) assim como as demais pesquisas tomadas para a análise neste estado do conhecimento, não cita quais as práticas desenvolvidas pelos professores de Educação Física na Educação Infantil, o que mais uma vez difere do propósito desta pesquisa, que apesar de possuir abordagem qualitativa, objetiva, conforme mencionado, analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física na Educação Infantil do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC.

Com base nas leituras das produções realizadas, percebe-se que vários são os fatores que influenciam o desenvolvimento das práticas dos professores de Educação Física no contexto da Educação Infantil, tais como: a formação inicial, a inserção e atuação profissional, a formação continuada, as condições de trabalho docente, especialmente no que se refere à estrutura física, recursos e materiais didáticos, entre outros. Todavia, há também muitos questionamentos acerca do desenvolvimento do trabalho docente. Além dos que se referem à mobilização dos saberes teóricos advindos do processo formativo, tem-se as indagações de como o professor pode organizar e executar sua prática pedagógica de modo que o processo de ensino faça sentido e produza significado para as crianças da educação infantil.

É, neste contexto, que interessa analisar sobre as práticas pedagógicas dos professores de Educação Física na Educação Infantil, ao se considerar as especificidades que as crianças apresentam nessa primeira etapa da Educação Básica, por levar em consideração que a Educação Física se constitui em um componente curricular instituído em uma etapa da educação em que, em tese, não há fragmentação do currículo. Assim, no próximo tópico conceitua-se os termos Educação Física na Educação Infantil e prática pedagógica, no sentido de aprofundar as reflexões teóricas e metodológicas que se realizou na análise das entrevistas.

4. Educação física na educação infantil

A inserção da Educação Física no contexto escolar, ocorre a partir da reforma de Couto Ferraz em 1851 (Decreto nº 630/51), que a tornou obrigatória nas escolas do município da Corte. Desde então, vários decretos, pareceres e leis legitimaram a inserção da Educação Física no espaço escolar, tais como: o Decreto nº 7.247, de 19 de abril de 1879 que instituiu a em seu Art. 4º e 9º a “Gymnastica” - até então denominada na época - como disciplina nas Escolas Primárias do município da Corte e nas Escolas Normais do Estado (BRASIL, 1879). A Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, estabeleceu em seu Art. 22 a prática obrigatória da Educação Física nas etapas do ensino primário e médio (BRASIL, 1961). A Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971, ratificou em seu Art. 7º a obrigatoriedade da inclusão da Educação Física como disciplina do 1º e 2º grau (BRASIL, 1971a).

A partir da Lei 5.692/71, o Decreto nº 69.450/71 passa a regulamentar o Art. 22 da Lei 4.024/61 instituindo que: “A educação física, desportiva e recreativa integrará, como atividade escolar regular, o currículo dos cursos de todos os graus de qualquer sistema de ensino” (BRASIL, 1971b). Contudo, é somente em 1996, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9.394/96, que a Educação Física, da forma como a conhecemos hoje, passa a integrar os currículos escolares de toda a Educação Básica.

A partir de tal legislação, a Educação Física que até então era ministrada no Ensino Fundamental e Ensino Médio, passa a integrar também a primeira etapa da Educação Básica: a Educação Infantil. Vale dizer que tal etapa passa a integrar a Educação Básica com a publicação desta lei, tendo como finalidade o “[...] desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade” (BRASIL, 1996).

Nesse sentido, pensar a Educação Física na Educação Infantil tornou-se um desafio, especialmente ao se considerar sua constituição histórica enquanto componente curricular da primeira etapa da educação básica e ao levar em consideração as singularidades que a educação da pequena infância apresenta. Garanhani (2008) reflete que a própria Educação Infantil se constitui como um desafio. Conforme a autora, um dos desafios do campo da Educação Infantil está no fato desta buscar uma organização curricular diferenciada da organização dos conteúdos escolares, pois o cuidar/educar na educação da pequena infância são indissociáveis (GARANHANI, 2008).

Destarte, a autora coloca que a Educação Física na Educação Infantil “[...] se preocupa com a organização de uma prática diversificada, lúdica, desafiadora e segura [...]” (GARANHANI, 2008, p. 137). Não obstante, Lima et al. (2007, p. 116) apresentam que a Educação Física na Educação Infantil “[...] dar-se-á no âmbito do alargamento das experiências de movimentos das crianças, pois o movimento humano, muito mais do que uma ação corporal é o diálogo que o ser humano estabelece com o mundo”. À vista disso, nota-se que a inserção da Educação Física na Educação Infantil requer certo cuidado, de modo que a área não perca sua especificidade, mas também não se torne uma disciplina escolar de caráter compensatória (LIMA et al., 2007).

Em concordância, Buss Simão (2005, p. 168) afirma que a Educação Física na Educação Infantil “[...] busca uma cultura Corporal de Movimento”, que para a autora implica em considerar que “[...] os movimentos corporais são para as crianças pequenas, um meio de comunicação, de expressão e de interação social” (BUSS SIMÃO, 2005, p. 166).

Conforme o exposto, compreende-se que a Educação Física na Educação Infantil se materializa por meio do movimento, sendo este, entendido além dos seus aspectos motor, como um meio de experiência, interação, diálogo, comunicação e apropriação dos saberes do contexto em que as crianças estão inseridas.

4.1. Práticas pedagógicas

Na atualidade, vários dilemas são postos à educação - além das questões relativas à desvalorização profissional dos professores - essa tem sido alvo de visões políticas conservadoras, em que diversos fatores têm colaborado para minimizar a formação emancipada do sujeito. Deste modo, faz-se necessário refletir sobre a prática pedagógica.

Sacristán (1999 apud MACENHAN; TOZETTO; BRANDT, 2016, p. 507) conceitua prática educativa “[...] como algo a mais que a expressão do ofício dos professores [...]”. Nas palavras do autor “[...] a gênese da prática educativa está em outras práticas capazes de interagir com o sistema escolar, mantendo relação com os demais âmbitos da sociedade” (SACRISTÁN, 1999 apud MACENHAN; TOZETTO; BRANDT, 2016, p. 507).

Nesse sentido, percebe-se que não há como conceituar prática pedagógica atribuindo-lhe um significado pronto e acabado, pois essa não se dissocia das relações sociais, políticas, culturais e econômicas da sociedade (LIBÂNEO, 2010). Em concordância a perspectiva anunciada, Fernandes (2011) apresenta que a prática pedagógica está articulada, além dos métodos, medidas e estratégias de ensinar, com: "[…] a educação como prática social e ao conhecimento como produção histórica e social, datada e situada, numa relação dialética entre prática-teoria, conteúdo-forma e perspectivas interdisciplinares" (FERNANDES, 2011, p. 159).

Neste estudo, o conceito de práticas pedagógicas também está atrelado aos pressupostos da pesquisa como princípio educativo de Demo (2005). Considera-se que a pesquisa para o professor levará ao caminho da autoria e da criação de métodos e metodologias, voltando seu esforço para a educação autoral do aluno. Desta forma, Demo (2005, p. 38-39) apresenta cinco desafios da pesquisa para o professor: “1. (Re)-construir projeto pedagógico próprio; 2. (Re)-construir textos científicos próprios; 3. (Re)-fazer material didático próprio; 4. Inovar a prática didática; 5. Recuperar constantemente a competência”. O professor neste caso, deve saber gerir e construir sua proposta pedagógica com “[...] virtuosismo inequívoco, [...] com pé e cabeça, começo, meio e fim” (DEMO, 2005, p. 39).

Assim, entende-se que há concepções distintas acerca da ação educativa, e que a prática pedagógica, além da relação professor-aluno e a relação que o professor estabelece com o contexto em que está em inserido, se constitui de iniciativa, criatividade, busca, pensamento crítico, inovação, reflexão sobre sua ação e, sobretudo, a invenção. De modo geral, compreende-se que a prática pedagógica está atrelada aos saberes advindos do processo formativo e das experiências. Concorda-se com Serres (1993, p. 108-109) quando aborda que a invenção é o único ou mais importante ato intelectual em que o professor na sua prática pedagógica deve se dedicar. Nas palavras do autor:

[...] A meta da instrução é o fim da instrução, quer dizer, a invenção. A invenção é o único ato intelectual verdadeiro, a única ação inteligente. O resto? Cópia, impostura, reprodução, preguiça, convenção, batalha, sono. Só a descoberta desperta. Só a invenção prova que se pensa de verdade a coisa que se pensa, seja qual for esta coisa. Penso, portanto invento; invento, portanto penso: única prova de que um sábio trabalha ou de que um escritor escreve.

A invenção caracteriza a prática pedagógica do professor qualificado, uma vez que abrange muitas dimensões, ou seja, permeia-se por uma postura de vigilância epistemológica, de autoria e de aprofundamento crítico e reflexivo, sendo capaz de articular e combinar com virtuosismo processos e métodos ao mesmo tempo.

Conforme abordado na seção anterior, a Educação Física na Educação Infantil, materializa sua prática pedagógica por meio das experiências de movimento, sobretudo, quando os(as) professores(as) inventam e criam seus métodos e metodologias.  Significa dizer que para inventar e criar métodos e metodologias este profissional busca superar a tradição da repetição, ou seja, quando é capaz de combinar e articular processos ou métodos com habilidade tanto bem quanto seus inventores (VANZUITA, 2016).

Diante do exposto, com o intuito de analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física na Educação Infantil, realizou-se um estudo empírico com professores de Educação Física atuantes na Educação Infantil no bairro Cidade Nova do município de Itajaí/SC, no qual os resultados serão apresentados no próximo tópico.

5. As práticas pedagógicas dos professores de educação física na educação infantil no bairro cidade nova em Itajaí/SC

Visando analisar como são desenvolvidas as práticas pedagógicas de professores do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC elaborou-se um roteiro de entrevista estruturado com 36 questões, sendo 16 questões fechadas e 20 questões abertas. As questões fechadas foram divididas em: dados pessoais, formação e atuação profissional. Com referência às questões abertas elencou-se as seguintes categorias: saberes formativos, atuação profissional e práticas pedagógicas. De modo a orientar o leitor, para o desenvolvimento desta análise selecionou-se algumas das questões elaboradas. Para levantar o perfil profissional dos professores participantes, inicialmente, questionou-se os participantes da pesquisa quanto à sua idade, gênero, etnia e residência. Os resultados encontram-se sistematizados no Quadro 1.

Quadro 1
Perfil dos Entrevistados

Entrevistados [3]

Idade

Gênero

Etnia

Residência

Ilma

21 a 30 anos

Feminino

Branco

Camboriú

Paulo

31 a 40 anos

Masculino

Branco

Itajaí

Lev

31 a 40 anos

Masculino

Branco

Itapema

Selma

31 a 40 anos

Feminino

Branco

Camboriú

Vitor

31 a 40 anos

Masculino

Branco

Itajaí

Christian

31 a 40 anos

Masculino

Branco

Itajaí

José Carlos

31 a 40 anos

Masculino

Branco

Itajaí

Reinaldo

21 a 30 anos

Masculino

Não declaro

Camboriú

Miguel

41 a 50 anos

Masculino

Branco

Balneário Camboriú

Jean

21 a 30 anos

Masculino

Pardo

Balneário Camboriú

Fonte: Dados obtidos pela pesquisadora por meio das entrevistas

Com base nas respostas dos entrevistados, percebe-se que a maioria são professores que se encontram na faixa etária entre 31 a 40 anos, seguido de professores jovens entre 21 a 30 anos. Os dados revelam ainda que dos 10 professores entrevistados, 8 são brancos, o que remete ao processo de constituição histórica de nosso país, que vem negando a grande maioria das pessoas negras e de classes sociais desfavorecidas o acesso à escolarização, excluindo-as do acesso aos direitos sociais básicos, entre eles a escolarização básica e superior. Já em relação à formação dos professores entrevistados, perguntou-se sua maior titulação, como observa-se no Quadro 2.

Quadro 2
Formação

Entrevistados

Titulação

Titulação em

Ilma

Especialização (Cursando)

Educação da Pequena Infância

Paulo

Especialista

Psicomotricidade, Atividade Física e Condicionamento Físico e Saúde

Lev

Especialista

Neuropsicopedagogia

Selma

Especialista

Treinamento Desportivo

Vitor

Graduado

Licenciatura e Bacharelado em Educação Física

Christian

Especialização (Cursando)

Jogos e brincadeiras

José Carlos

Especialista

Ciências da Saúde e Desporto

Reinaldo

Especialista

Pós-graduação esportiva

Miguel

Especialista

Educação psicomotora e Neuropsicopedagogia

Jean

Mestre

Educação e infância

Fonte: dados obtidos pela pesquisadora por meio das entrevistas

Os dados apresentados revelam que a maior parte dos professores foram em busca de uma formação continuada em nível de pós-graduação Lato Sensu voltada para a área de atuação na qual hoje se encontram. Ainda em referência à categoria de formação, questionou-se os participantes da pesquisa quanto ao período de sua formação inicial, a modalidade e a rede de educação. Os entrevistados informaram em unanimidade que realizaram sua formação inicial na modalidade presencial e na rede privada (ou seja, universidade paga, podendo ser de caráter comunitário).

No que se refere à atuação profissional dos professores entrevistados, questionou-se quanto a carga horária de trabalho, turno, tempo de atuação, quantidade de instituições que trabalham e vínculo profissional. As respostas obtidas apresentam-se no quadro 3.

Quadro 3
Atuação Profissional

Entrevistados

Carga horária

Turno

Tempo de atuação

Instituições

Situação trabalhista

Ilma

40 horas

Integral

2 a 5 anos

1

Efetivo

Paulo

40 horas

Integral

6 a 10 anos

3

Efetivo

Lev

20 horas

Matutino

2 a 5 anos

2

Efetivo

Selma

30 horas

Integral

6 a 10 anos

1

Efetivo

Vitor

30 horas

Integral

2 a 5 anos

1

Efetivo

Christian

40 horas

Integral

6 a 10 anos

1

Efetivo

José Carlos

40 horas

Integral

11 a 15 anos

2

Efetivo

Reinaldo

30 horas

Integral

6 a 10 anos

2

ACT [4]

Miguel

30 horas

Integral

16 a 30 anos

1

Efetivo

Jean

10 horas

Matutino

6 a 10 anos

1

ACT

Fonte: dados obtidos pela pesquisadora por meio das entrevistas

Conforme apresentado no quadro 3, constata-se que a grande maioria dos professores entrevistados são efetivos, atuando apenas em uma instituição de ensino e em tempo integral, o que oportuniza um trabalho docente duradouro, com possibilidade de criação de vínculo com a instituição e com as crianças. Além disso, pode-se perceber que a maior parte dos professores não se encontram mais no início de carreira, o que pode representar a escolha profissional assertiva desses professores.

Ainda em relação a atuação profissional, perguntou-se aos entrevistados se os mesmos exercem outra atividade remunerada. Dos cinco professores que informaram que a docência não é sua principal ocupação, mencionaram que atuam como: Árbitro, Instrutor de Academia, Treinador Esportivo, Supervisor Escolar e Comércio. Conforme as respostas dos participantes, percebe-se que grande parte dos professores exercem outras atividades ocupacionais relacionadas a área de formação inicial, ilustrando a diversidade de possibilidades de atuação dos profissionais formados na área da Educação Física. 

Adentrando na categoria de saberes formativos das questões abertas, indagou-se os entrevistados se os conhecimentos sobre a Educação Física na Educação Infantil estudados/discutidos durante a formação inicial foram suficientes para sua atuação profissional na Educação Infantil.

Com base na pergunta realizada, um dos entrevistados informou: “Eu acredito que foi um pouco defasado, porque quando eu fiz na Univali, era a primeira turma, então não tinha muitas experiências. Então eu tive que acabar procurando bastante coisa fora (Lev)”. Outro aponta que “Na universidade, faculdade enfim, é só um esboço, uma coisa superficial que torna as coisas primárias (Reinaldo)”. Nessa perspectiva, uma das entrevistadas argumenta:

“Não, porque na verdade você tem uma base de tudo [...] Na Educação Física durante o curso, falando da Licenciatura, porque não fiz o Bacharel. Você tem uma base de como é tudo. Aí você faz um estágio na Educação Infantil e quando você chega aqui para assumir uma sala, uma turma, um C.E.I. desse tamanho é totalmente diferente (Ilma)”.

Conforme apresentado nas falas dos professores acima, pode-se perceber que o processo de formação inicial ora é tido como insuficiente, ora como defasado, em que se atribui a formação inicial uma visão e vivência geral da área. Pode-se interpretar também que, apesar de ser uma licenciatura, pouco se discute sobre a educação da pequena infância, e, a experiência que se tem com a mesma ocorre por meio do estágio, causando assim, no exercício da docência o choque de realidade. Além disso, tais depoimentos reforçam a ideia de que é preciso partir dos saberes do processo formativo, mas é indispensável ir além, pesquisar, buscar, inventar. Isso significa que não há como ficar apenas como porta voz de teorias de outrem, é essencial mostrar-se autor.

O que remete, novamente, a ideia da criação de métodos e metodologias apresentado por Vanzuita (2016) ao mencionar que no exercício da docência os professores precisam construir, combinar ou articular métodos e metodologias tão bem quanto seus inventores, ou seja, buscam por meio da pesquisa o aperfeiçoamento de suas práticas pedagógicas, tornando-se criativos e inventivos.

Dando continuidade às análises, na categoria dos saberes formativos, questionou-se aos professores entrevistados se os temas abordados nas formações continuadas [5] oferecidas pela rede municipal de ensino de Itajaí agregaram para o desenvolvimento de suas propostas de ensino. Para alguns professores entrevistados, principalmente, na concepção de Ilma e Selma, as formações realizadas somaram-se e muito no desenvolvimento de seu trabalho, como observa-se em seus depoimentos:

“Nas (formações) antigas principalmente, eles trouxeram professores muito bons. Trouxeram o Fabiano, que foi Professor da Univali que hoje atua lá em Floripa. Trouxeram a Marynelma, que para mim foi a melhor assim, trouxeram ela umas duas vezes. Trouxeram o Odimar Leite.  Eu acho que a troca de experiência que eles promoveram algumas vezes, você ir lá e mostrar para os seus colegas as atividades que talvez eles não teriam pensado ainda e você vê atividades que não tinha pensado ainda. Então, acho que agregam sim (Ilma (grifos da pesquisadora))”.

“Muito, porque nos encontros que eles fazem, eles dão alguns temas, eles trazem pessoas, eles às vezes pedem para gente apresentar coisas do nosso trabalho, e aí é uma troca de experiência, porque daí a gente vê a atividades que o professor fez lá no CEI tal, e aí a gente: Ah! (Poderia fazer) no meu C.E.I. Então eu acho bem válida (Selma (grifos da pesquisadora))”.

Com base nas respostas das professoras entrevistadas, percebe-se que a formação continuada oferecida se constitui num espaço privilegiado de trocas de experiências, relações, diálogos, construção e reconstrução de conhecimentos, mas também como um espaço de reflexão crítica sobre a ação prática. Todavia, ao analisar mais profundamente as falas de Ilma e Selma, nota-se o quanto essas formações são significativas para o desenvolvimento do trabalho docente, especialmente ao mencionarem o fato do próprio professor ser chamado para apresentar suas experiências aos colegas. Este momento da formação, conforme a concepção assumida neste estudo, se institui em uma oportunidade de reconhecimento e autoria desses profissionais, em que por meio de sua busca e pesquisa torna-se possível articular práticas que concretizem a capacidade de criação e invenção (DEMO, 2005; SERRES, 1993).

Em relação à categoria de atuação profissional, indagou-se aos professores entrevistados como se sentiram ao atuarem na Educação Infantil pela primeira vez. Em suas falas, os entrevistados relatam:

“Eu me senti assustado, porque durante a faculdade o meu pior estágio foi com a educação infantil, foi mais difícil de trabalhar com os pequenos, porque nunca tive o contato. Mas, depois com o tempo a gente vai pegando a manha, vai vendo como é que funciona o mundinho deles, é bem legal, gratificante (Lev)”.

“Perdido [risos] totalmente perdido, porque foi como eu te falei em uma resposta anterior, fomos preparados na faculdade para trabalhar com crianças maiores, né! E a gente chega na Educação Infantil, tudo é ao contrário, é o choro, é o sujar a fralda, eu quero a minha mãe, a gente tem que lidar com tudo isso também, fora o conteúdo que também é difícil de inserir para eles (José Carlos)”.

“Foi muito doido, porque, é difícil no começo. São várias crianças falando o teu nome, querendo atenção e tu tem que dar. Até tu tomar conhecimento, como impor as regras, limites, como que cada um trabalha, até eles te conhecerem foi bem, bem estranho, mas foi legal! (Reinaldo)”.

De acordo com as falas dos professores, percebe-se que os sentimentos são: perdidos, assustados e loucura. Sentimentos esses, que são reverberados de justificativas relacionadas aos saberes do processo formativo. Nota-se também que há insegurança por parte dos professores, que se questionam se as crianças irão lhes aceitar, se serão compreendidos e irão compreender as crianças. Contudo, observa-se que com as experiências vivenciadas, os sentimentos iniciais passam, os professores vão apropriando-se das necessidades e especificidades desta faixa etária e, vão descobrindo as possibilidades que esta etapa de ensino pode lhe proporcionar.

Isso remete à concepção de Demo (2005), em que atribui a pesquisa como a descoberta do novo, a criação de novos caminhos e conhecimentos. Nesse sentido, os professores que têm a possibilidade da prática da pesquisa, da construção do conhecimento, da autoria, sejam em seu processo formativo ou no desenvolvimento de sua prática pedagógica não sentem tanta insegurança em tratar com os desafios da docência, com o inesperado, uma vez que a pesquisa e a construção do conhecimento exigem coragem e persistência.

Ainda nessa categoria de atuação profissional, perguntou-se aos professores entrevistados como percebem as condições físicas e materiais de seu local de trabalho. Em relação às condições físicas, houve divergências nas respostas, pois para alguns, os espaços em seus locais de atuação são excelentes, já para outros os espaços são precários. O fato é que o espaço é um elemento imprescindível para a Educação Física, constituindo-se de um elemento que influencia diretamente o desenvolvimento do trabalho docente, pois ao considerar que as práticas pedagógicas dos professores de Educação Física na Educação Infantil se materializam pela Cultura Corporal de Movimento (TAFFAREL, 2003), compreende-se que é preciso haver mais espaços físicos em alguns Centros de Educação Infantil do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC para que o movimiento seja experimentado, entendido nessa etapa da educação como expressão, comunicação, dialogo e interação social, (BRASIL, 2010).

Com relação aos materiais, as falas dos professores entrevistados ora remetem a condições precárias e insuficientes, ora são apresentadas como boas. Entretanto, os professores que mencionaram as condições dos materiais como precárias e insuficientes, trouxeram elementos em suas falas que visam à criação, invenção e busca, tentando suprir essa falta de materiais, conforme identifica-se nos depoimentos a seguir:

“O material, para mim, é precário, porque o meu material foi tirado daqui da sala da supervisão, porque estava muito apertado e foi colocado numa sala, mas não se preocuparam em colocar uma porta, o material foi roubado [...]. Aí, tenho que improvisar, criar outras coisas (Ilma)”.

“Material é o que falta bastante assim. A gente tem que se virar com o que aprendeu na faculdade, usar a criatividade, fazer do bambolê um outro instrumento, né! Mas acho que isso não é só um problema meu, acho que todos os professores da região passam por isso (Christian)”.

A partir das falas dos entrevistados, ilustra-se o já exposto de que as condições de trabalho são elementos que interferem diretamente no desenvolvimento das práticas pedagógicas dos professores, pois sua ausência e insuficiência compromete a realização de um bom trabalho. Além disso, percebe-se na fala desses profissionais que a utilização da criatividade está atrelada a superação das dificuldades materiais impostas pelo contexto. Acredita-se que essa condição também provoca o desenvolvimento de estratégias que possibilitam a criação e invenção. Há que se dizer, no entanto, que na concepção abordada no decorrer desta pesquisa, em relação a prática pedagógica de criação de métodos e metodologias no exercício da docência e da pesquisa como princípio educativo, essa se dá a partir da busca, da elaboração própria, da autoria, da autonomia, visando, assim, a construção e ampliação do conhecimento e das práticas pedagógicas dos professores de Educação Física (DEMO, 2005; 2008; 2011; SERRES, 1993).

Por fim, na categoria de práticas pedagógicas, uma das questões realizadas aos professores entrevistados referem-se aos conteúdos da Educação Física Escolar que são desenvolvidos em suas propostas de ensino. Nas entrevistas, os professores informaram que desenvolvem suas práticas com atividades que envolvem: “força, velocidade, equilíbrio, coordenação motora ampla, coordenação motora fina, esquema corporal e lateralidade”.

Com base nas respostas obtidas, percebe-se que os professores não informam diretamente os conteúdos que realizam em suas propostas de ensino, remetendo-se apenas às atividades que propõem. Vale mencionar que de acordo com as Recomendações para a Educação Física Escolar do Conselho Federal da Educação Física (CONFEF), os conteúdos que abrangem a Educação Física Escolar são: “jogos, brincadeiras, atividades esportivas, atividades rítmicas e expressivas, ginásticas, danças, lutas e conhecimentos sobre seu corpo” (CATUNDA; SARTORI; LAURINDO, 2014, p. 25).

À vista disso, para identificar as práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física na Educação Infantil do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC questionou-se aos participantes da pesquisa como desenvolvem a prática da Educação Física com as crianças da Educação Infantil. Os professores sinalizaram que as práticas desenvolvidas com as crianças na Educação Infantil voltam-se de acordo com a faixa etária em que se encontram.

Com as crianças de berçários, os professores mencionaram que desenvolvem atividades que “despertam a curiosidade, de estimulação, com água, caixas, manipulações dos materiais da Educação Física e exploração de brinquedos de diferentes texturas”. Já com as crianças que frequentam o maternal e os jardins, as atividades centram-se em: “correr, saltar, pular, equilíbrio, bola e, brincadeiras espontâneas”. Todavia, com o pré-escolar, os professores afirmaram realizar as atividades dos jardins e maternais, mas com objetivos mais aprofundados. Além de realizarem atividades de estafetas e brincadeiras lúdicas.

Assim, conforme apresentam as falas dos professores, observa-se que as práticas pedagógicas dos professores de Educação Física que atuam na Educação Infantil do Bairro Cidade Nova em Itajaí/SC são diversas e indicam que os professores se preocupam em orientar as crianças no caminho das experiências de movimento e de criação. Pode-se afirmar ainda que os professores de Educação Física que atuam neste contexto procuram renovar suas práticas pedagógicas por meio das experiências de movimento que permitem desenvolver a criatividade e a construção de conhecimento.

6. Conclusões

A partir das razões apresentadas para o desenvolvimento desta pesquisa, partiu-se do seguinte questionamento: quais práticas pedagógicas são desenvolvidas por professores de Educação Física em turmas de Educação Infantil? Para responder a este questionamento, buscou-se analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física na Educação Infantil do bairro Cidade Nova em Itajaí/SC, de modo a atingir o objetivo proposto.

Tendo em vista o objetivo principal deste estudo, a realização da pesquisa empírica foi indispensável. Os dados revelaram que os professores de Educação Física que atuam na Educação Infantil do bairro Cidade Nova estão na faixa etária entre 31 a 40 anos, seguido de 21 a 30 anos e, são majoritariamente especialistas, do gênero masculino, efetivos no município, exercendo 40 horas semanais.

Com referência aos conteúdos da Educação Física desenvolvidos por esses profissionais, não foi possível identificá-los com precisão, pois os professores participantes da pesquisa não os informaram diretamente, mas apresentaram que suas propostas estão atreladas atividades com ênfase aos aspectos físicos-motor, como também buscam desenvolver atividades voltadas para a questão de sentimentos, valores, expressão, linguagem e interação.

Por fim, com o desenvolvimento da pesquisa, observou-se que as práticas pedagógicas dos professores de Educação Física na Educação Infantil no bairro Cidade Nova em Itajaí/SC indicam que esses profissionais além de produzirem ações alternativas no seu próprio contexto escolar, buscam estratégias diversificadas, pesquisam, criam e recriam seus métodos, demonstram ser criativos, interagem com as crianças e procuram causar experiências de movimentos diversos.

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1. Possui graduação em Pedagogia pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Catarinense – Campus Camboriú. E-mail: amandafantatto@gmail.com

2. Doutor em Educação pela Universidade do Vale do Itajaí. Professor permanente do Mestrado em Educação do IFC Campus Camboriú. E-mail: alexandre.vanzuita@ifc.edu.br

3. Atribuímos nomes fictícios aos professores participantes dessa pesquisa, visando garantir o sigilo de suas identidades.

4. Admitido em Caráter Temporário.

5. Para esclarecer o leitor, até a gestão do ano de 2016 no município de Itajaí, os profissionais da Educação Física atuantes na Educação Básica recebiam mensalmente formações específicas voltadas para a educação.


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 40 (Nº 26) Ano 2019

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