Vol. 38 (Nº 15) Año 2017. Pág. 9
Marcio Coutinho de SOUZA 1; Jose Gaspar ROSA 2
Recibido: 06/10/16 • Aprobado: 23/11/2016
2. Procedimentos metodológicos
RESUMO: O artigo analisa o ENEM como política pública educacional e suas implicações no cotidiano escolar. Trata-se do recorte de uma pesquisa, cujo objetivo geral foi analisar as consequências deste exame e seu ranqueamento no trabalho pedagógico em escolas de Minas Gerais. Os dados revelam que esta classificação vem provocando alteração das práticas escolares com vistas a se classificarem melhor nos futuros ranqueamentos; a existência de competição entre escolas e o estreitamento curricular, uma vez que as ações de sala de aula são planejadas com ênfase em preparar o estudante apenas para se sair bem na prova. |
ABSTRACT: The main objective of this article is to analyze the Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) as a public educational policy, and its implications at daily school life. It`s, in fact, a profile of a further analysis, which intend to disentangle the consequences of Enem`s rank into pedagogical work of schools located at the interior of the state of Minas Gerais. The final data reveal that many institutions are changing their plans and practices into the classroom, with the only objective to make the students get better grades at the exam, improving the school rank for consequence. |
O presente artigo tem como objetivo compreender e analisar as consequências do ranqueamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) no currículo e nas práticas pedagógicas em escolas do ensino médio. Trata-se do recorte de uma pesquisa de mestrado desenvolvida com o objetivo de apreender as implicações deste ranqueamento na organização do trabalho pedagógico em escolas de ensino médio mineiras, notadamente na cidade de Teófilo Otoni, no interior de Minas Gerais.
Neste recorte será discutido o significado do Enem, a importância do currículo na formação do estudante, os efeitos deste exame nas escolas do ensino médio e em que medida seus resultados influenciam em suas práticas pedagógicas e nos currículos escolares, a partir dos teóricos e estudos realizados.
O presente trabalho utilizou como metodologia a análise dos documentos que regulamentam o Enem e pesquisas bibliográficas a partir das pesquisas acadêmicas realizadas sobre o tema, além de artigos em periódicos e livros de autores como Moreira (2001), Freire (2005), Silva (2005), entre outros que abordam a temática e discorreram sobre a importância da avaliação no currículo do ensino médio brasileiro, suas alterações ao longo dos anos e as transformações provocadas pelo Enem no interior das escolas.
Fez-se a opção por uma metodologia que privilegiasse a interpretação qualitativa. Este enfoque se fez necessário em decorrência de seu caráter interpretativo, dialógico e pela a sua adequação ao estudo em questão. A razão de se optar pelo enfoque qualitativo deveu-se à possibilidade de concentrar a investigação nas nuances e na riqueza do processo mais do que nos resultados, pois se constituiu em estratégia capaz buscar os significados mais profundos do objeto de estudo, observando-o tanto em sua dinâmica própria quanto em sua relação com o todo da organização escolar. Dessa forma, para essa pesquisa foram empregadas as metodologias: exploratória e bibliográfica.
A pesquisa exploratória pela possibilidade de se familiarizar com um assunto ainda pouco conhecido, pouco explorado. Nessa perspectiva, buscou-se às fontes bibliográficas relacionadas com a temática em questão, visando definir o referencial teórico para compreender o desenvolvimento da educação no Brasil, o ensino médio e avaliação deste nível de ensino e seu currículo, e as diretrizes do Enem.
Para tal, a pesquisa bibliográfica possibilitou um amplo alcance de informações, além de permitir a utilização de dados expostos em inúmeras publicações, Desta forma foram analisadas as produções de pesquisadores de diversas áreas, documentos oficiais, pesquisas realizadas por instituições nacionais e internacionais que permitiu a elaboração de uma revisão da literatura possibilitando uma melhor compreensão dos meandros das políticas educacionais no país e as suas alterações provocadas pelo Enem.
Em 1998 foi editada pelo Ministério da Educação a Portaria nº 438 instituindo o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), que possuía dentre seus objetivos criar uma referência nacional para os egressos do ensino médio e fornecer subsídios às modalidades de acesso à educação superior, constituindo assim em uma ferramenta que permitia perceber se as diretrizes do ensino médio estavam sendo cumpridas, se os alunos estavam adquirindo as habilidades e competências propostas por este ciclo escolar e, segundo o discurso oficial, criar a possibilidade de contribuição para a melhoria da qualidade escolar.
A participação no exame pelo aluno deveria acontecer de forma voluntária, poderia realizar a prova quantas vezes quisesse, sendo que poderiam participar os alunos que estivessem concluindo ou já concluído o ensino médio bem como aqueles que não tivessem encerrado este ciclo, já que a nota do exame poderia certificar sua conclusão, desde que atendessem a alguns requisitos.
Conforme Carneiro (2012) os documentos que respaldam a criação e o funcionamento do Enem foram principalmente: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Nº 9.394/96, a Portaria MEC nº 438/98, o Programa de Reestruturação e Expansão do Ensino Médio no Brasil/2008, Programa “Ensino Médio Inovador/2009, Portaria do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) nº 04/2009, (Certificação do Enem para conclusão do ensino médio) e outros documentos.
O Enem se constituiu em uma política pública de Estado norteada pela opção ideológica do período. A criação e implantação deste exame ocorreram no governo de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) surgindo “num contexto internacional de valorização das avaliações padronizadas atreladas a políticas de responsabilização- prestação de contas” Travitzki (2013, p. 110) sob a égide de um programa neoliberal que influenciou sobremaneira esta política, pois como afirma Hoffling (2001, p. 35) as políticas “implementadas pelo Estado capitalista sofrem o efeito de interesses diferentes expressos nas relações sociais e de poder”.
A proposta neoliberal defende a retirada parcial da responsabilidade do Estado na oferta de educação pública universal a toda sociedade e propõe que esta seja dividida entre Estado e setor privado. Propõe ainda a implantação de ações visando obter maior eficiência na gestão escolar, na aplicação dos recursos e também no processo de aprendizagem. Segundo Carneiro (2012) a partir deste período o Estado assume uma postura gerencial e avaliadora disseminando o principio de que uma regulação centralizada resultaria na melhoria da qualidade educacional.
Desta forma todas as políticas públicas voltadas para a educação a partir deste período são estabelecidas dentro destas diretrizes. Neste sentido, o Estado passou a criar uma serie de políticas de avaliação com o objetivo de obter informações que lhe permitisse estabelecer uma nova política para ser implementada junto à educação básica e que também lhe propiciasse um maior controle sobre o sistema educacional (CARNEIRO, 2012).
Dentre elas, merecem destaque as políticas públicas implantadas para atender o Ensino Médio que estabeleceu como finalidades básicas para este ciclo: i) a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos, ii) a preparação básica do educando para trabalho, a cidadania e a capacidade de aperfeiçoamento posteriores, iii) o aprimoramento do educando no aspecto ético e critico, iii) a capacidade de compreender os fundamentos dos processos científicos e tecnológicos e ser capaz de relacionar sua teoria com a prática. Esta mesma legislação também estabelece que o ensino médio adotará metodologias de ensino e avaliação para promover estimulo ao estudante.
Dentro desta visão, o Conselho Nacional da Educação e a Câmara de Educação Básica (CNE/CEB) ao determinar as diretrizes para o ensino médio, ponderou que o Brasil precisa investir na educação para alcançar o desenvolvimento o que só será possível se houver crescimento da capacidade tecnológica e da formação de profissionais de nível médio. Para que isto aconteça segundo Neubauer (2011) será necessário a convergência das políticas educacionais para alguns pontos comuns, tais como: o estabelecimento de novas diretrizes e materiais curriculares, implantação de programas de recuperação e enriquecimento da aprendizagem, capacitação de professores e a utilização de avaliações de rendimento escolar com a utilização de seus resultados para planejar tendo como objetivo alcançar metas pré-estabelecidas.
Assim, para atender a necessidade de uma avaliação escolar no ensino médio, em 1998, foi lançado pelo governo brasileiro o Projeto “Acorda, Brasil, está na hora da escola!” possuindo como uma de suas propostas, a criação de um sistema unificado de avaliação externa.
De acordo com Camelo (2010) um exame curricular externo é uma prova que possui dentre seus objetivos avaliar o aprendizado dos alunos ao saírem do ensino médio para ingressarem no Ensino Superior ou no mercado de trabalho. Sendo assim
a ideía é que se este sinal estiver positivamente associado ao benefício que os alunos recebem após o ensino secundário (emprego ou acesso ao ensino superior) a existência destes exames deve alterar positivamente o nível de esforço dos alunos, conseqüentemente elevando seu aprendizado. A partir desta relação, alteram-se também os comportamentos de pais e gestores escolares no sentido de priorizar ações que mais elevem o desempenho dos alunos nestes exames. (CAMELO, 2010, p. 17).
Ainda na perspectiva de Camelo (2010), o Enem possui todas as características de uma avaliação externa, a saber: I- é um exame externo avaliando o aluno segundo um mesmo padrão em todo país, II- a nota final e uma somatória de varias notas para cada competência que sinaliza múltiplos níveis de desempenho; III- As questões das provas são preparadas baseadas em competências e habilidades aplicadas ao conteúdo do ensino básico, não se constituindo em avaliação de retenção de conteúdo; IV- É abrangente a partir do volume de alunos que prestam a prova Enem.
Tal afirmativa pode ser percebida ao se analisar os documentos de implantação do Enem que traz como proposta inicial avaliar a qualidade do ensino e proporcionar ao aluno condições que avalie suas deficiências e também qualidades diante das competências que foram oferecidas pelo ensino médio e que seriam necessárias para enfrentar o mundo.
Percebemos tal fato quando analisamos os documentos que norteiam o ensino médio, conforme citados por Carneiro (2012) que apresentam como objetivos do Enem: oferecer possibilidade para cada participante faça sua auto avaliação visando seu futuro, organizar uma avaliação ao final da educação básica que possa servir de alternativa de seleção em outras instituições pós-ensino e processos de seleção em setores do mercado de trabalho.
Segundo Santos (2011) este exame procurava relacionar a vivencia do aluno com os conteúdos conceituais por meio da cobrança das seguintes competências: “... domínio de linguagens, compreensão de fenômenos, enfrentamento de situações-problema, construção de argumentações e elaboração de propostas de intervenção na realidade”.
O Enem pode de fato ser considerado uma avaliação? É importante estabelecer a diferença entre exame e avaliação para entender essa questão. De acordo com Luckesi (2013) exame vem a ser a aplicação de provas com o objetivo de classificar e selecionar, enquanto a avaliação deve ser diagnóstica e inclusiva e possibilitar uma tomada de atitude, ou seja, a avaliação implica uma ação a partir do que foi diagnosticado. O Enem propõe elaborar um diagnóstico do quadro da educação brasileira e ao mesmo tempo proporcionar uma análise individual já que o resultado das provas é sigiloso permitindo que os alunos façam suas escolhas. Desta forma, o Enem se constituiu em um exame da educação, mesmo com a pretensão de ser considerado uma política de avaliação.
A partir de sua implantação o modelo de prova utilizado era composto por uma redação, uma prova interdisciplinar com 63 questões de múltipla escolha, aplicado em um único dia em todo país e sua correção era feita pela forma usual, ou seja, o resultado final era de acordo com o número de acertos.
A partir de 2009, o Ministério da Educação, alterou o Enem nos seguintes termos: i) foi implantado na prova, questões que exigem uma abordagem interdisciplinar do conhecimento vinculando a teoria e prática, ii) deveria funcionar também como instrumento indutor da renovação do ensino médio a partir da necessidade de se renovar sua grade curricular. Nesta perspectiva, atualmente o exame é constituído de quatro provas (uma para cada área do conhecimento) com 45 questões de múltipla escolha, uma redação aplicadas em dois dias de prova, conforme Marques (2013) foi alterado também o seu modelo de correção que passou a se basear na metodologia de Teoria de Resposta ao Item (TRI)
De acordo com o Inep, essa metodologia qualifica o item de acordo com três parâmetros: o poder de discriminação, que/e a capacidade de um item distinguir os estudantes que têm a proficiência requisitada daqueles que não a têm, o grau de dificuldade da questão o, e a possibilidade de acerto ao acaso (MARQUES, 2013, p. 16).
Sendo assim, conforme Carneiro (2012) esta metodologia possibilita a aferição das habilidades de cada aluno a partir dos itens que o mesmo acerta na prova com variados graus de complexidade.
Outra mudança implantada em relação ao Enem foi a possibilidade de se utilizar sua nota para ingresso no Ensino Superior. Até então o Enem era utilizado como mecanismo de seleção apenas por algumas universidades que geralmente utilizava a nota do exame em conjunto com notas obtidas na própria universidade por meios de provas específicas.
Como conseqüência destas alterações, a partir de 2009, as notas unificadas do Exame Nacional do Ensino Médio passaram a ser utilizadas pelas Universidades Federais como forma de ingresso através do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) mantido pelo MEC e através do qual os candidatos se inscrevem em diversas universidades apresentando suas notas. Conforme Carneiro (2012, p. 221) trata-se “... de um modelo de avaliação inspirado no Scholastic Aptitude Test / Scholastic Assessment Test - SAT, que consiste em uma das etapas para ingresso dos alunos no ensino superior nos EUA”.
Atualmente as instituições públicas de ensino superior e algumas privadas utilizam a nota do Enem para selecionar seus alunos, substituindo o vestibular que vem sendo gradativamente extinto, permanecendo apenas em algumas faculdades privadas.
A abrangência do exame é demonstrada por meio dos indicadores anuais do Enem que demonstram seu crescimento. No ano de 2015, o Enem recebeu as inscrições de 8.478.096 participantes, de acordo com informação do Ministério da Educação, no sitio https:// http://www.brasil.gov.br/educacao/2015/10/enem-2015-v2-01.jpg/view/.
Conforme Carneiro (2013), observa-se que desde sua implantação o ENEM vem recebendo um numero maior de inscrições em decorrência das alterações que foram instituídas no tocante aos seus objetivos e finalidades e principalmente porque o novo exame passou a ter grande importância como instrumento de seleção para o ensino superior.
Alem destas mudanças, o Ministério da Educação passou a divulgar além da nota individual de cada aluno, as notas das escolas em nível nacional de acordo com o resultado final, criando uma espécie de ranqueamento das unidades de ensino.
Para Travitzki (2013) a divulgação do resultado por escola, possui o objetivo de permitir que as mesmas avaliem seus resultados e estabeleçam estratégias visando a melhoria da educação. Entretanto, o que se percebe é que este ranqueamento vem provocando uma disputa entre as mesmas que estabelecem como objetivo melhorar sua classificação individual, que vem sendo utilizada como marketing para atrair novos alunos e investimentos financeiros.
Por outro lado, de acordo com Camelo (2010) o exame nacional do ensino médio vem se tornando um orientador para os estudantes, já que os mesmos irão procurar as escolas que estarão bem colocados no ranqueamento. Desta forma as unidades de ensino são obrigadas a buscarem a melhoria de sua qualidade escolar e esta colocação se transforma em um mecanismo de incentivo a melhoria do aprendizado, mas também “um agente mobilizador de pais, professores e gestores por melhorias na qualidade do ensino devido à existência de um sistema de divulgação de seus resultados por escola” (CAMELO, 2010, p. 29)
O que pode resultar em um estreitamento curricular, uma vez que as ações de sala de aula acabam sendo planejadas com ênfase em projetos de revisão de conteúdos possuindo o objetivo de preparar o aluno apenas para se sair bem na prova, conforme Neubauer (2011). Desta forma as ações pedagógicas da escola se voltam para uma boa nota no Enem hoje a principal avaliação do Ensino Médio em termos de visibilidade social.
Segundo Neubauer (2011) a grande maioria das escolas possui a preocupação de preparar os alunos para saírem bem na prova, ingressarem no ensino superior e ainda permitir que tenham um bom desempenho no ranqueamento divulgado a partir dos resultados obtidos pelos estudantes.
Sendo este fato também observado por outro pesquisador em seu trabalho:
De maneira geral, é possível resumir estes resultados como o tratamento da divulgação das notas tendo levado os professores de Matemática a desenvolverem com mais freqüência atividades com foco na resolução de problemas em detrimento de atividades ligadas mais a sua contextualização destes problemas (associação com situações da realidade etc.). (CAMELO, 2010, p. 61).
Ao avaliar os resultados do posicionamento das escolas frente às notas do Enem, é possível perceber que além das mudanças metodológicas e curriculares, acaba-se por formar também uma disputa entre as escolas:
No Brasil, particularmente em relação ao ENEM, a divulgação dos resultados vem acirrando os movimentos pela responsabilização dos professores e das escolas com relação aos resultados de seus estudantes ao mesmo tempo em que se instalam iniciativas de usar algum sistema de motivação e incentivo para os professores e para as escolas como forma de encorajar iniciativas que visem à 59 obtenção de melhores resultados e, consequentemente, a melhoria de posição na lista classificatória. (MELÃO, 2012, p. 59).
Tal situação está levando algumas escolas a estabelecerem critérios para selecionar alunos no seu ingresso, tendo em vista a futura classificação na lista do Enem
A existência de prova de seleção para os alunos seria uma medida de que as escolas estariam reagindo ao ENEM pela seleção de melhores alunos. Um contraponto a esta reação seria a existência de aulas de reforço, que demonstraria uma reação da escola no sentido de melhorar o desempenho dos alunos de pior desempenho. O comportamento dos professores será captado pelas atividades que eles desenvolvem em sala de aula. O tipo de atividade desenvolvida permitirá dizer quais passaram a ser as prioridades do professores, se passaram a ter maior foco, por exemplo, em resolução de exercícios ou em discussão de questões mais próximas a realidade dos alunos. (CAMELO, 2010, p. 31).
Esta classificação por escola tem provocado alterações metodológicas, mesmo que de forma indireta, porque a partir do momento que os docentes são submetidos ao resultado da classificação da escola com a divulgação do ranqueamento, acabam elaborando uma metodologia para treinar seus alunos para levá-los a obterem bons resultados em detrimento de se preocuparem em seguir os parâmetros curriculares do ensino médio, que dentre outros objetivos exige que o aluno aprenda a contextualizar os códigos e linguagens fornecidos nas disciplinas regulares (CAMELO, 2010).
Estudos de Travitzki (2013) demonstram os limites e as possibilidades do Enem como indicador de qualidade. O autor afirma que a partir do ano de 2005, o Brasil passou a contar com dois indicadores de qualidade escolar: o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e o Enem. Ressalta que há um grande crescimento da utilização do Enem como indicador de qualidade, mas considera que o mesmo apresenta uma fragilidade como avaliação já que apenas avalia o desempenho possuindo desta forma limitações técnicas. Acredita que “...nem por isso deixa de ser um indicador de qualidade. A julgar pelo impacto que costuma ter nos meios de comunicação, trata-se inclusive de um indicador bastante valorizado pela sociedade...” (2013, p. 210). Desta forma
Do lado dos estudantes, os exames curriculares afetariam positivamente o esforço e a motivação ao estudo devido às conseqüências que o bom desempenho no exame pode lhes trazer. Pelo lado de professores e gestores escolares, estes exames devem levá-los a melhorar a qualidade do ensino oferecido pela pressão exercida por pais e estudantes, uma vez que o desempenho das escolas nestes exames passa a ter maior visibilidade e ser mais importante para o futuro dos alunos. (CAMELO, 2010, p. 68).
Tal situação também foi observada na pesquisa de campo realizada junto aos gestores e docentes das escolas públicas de Teófilo Otoni. A partir da leitura dos resultados dos questionários e entrevistas, percebeu-se a existência de uma preocupação dos profissionais educacionais com o ranqueamento das escolas que participam do ENEM. Sendo assim, este ranqueamento adquiriu grande importância em decorrência de sua abrangência social se constituindo num mecanismo de avaliação das políticas educacionais a partir do retorno social gerado pelos seus resultados.
A maioria dos profissionais pesquisados afirmaram que a prática pedagógica vem sendo influenciada pelo Exame Nacional do Ensino Médio. Não restou dúvida quanto a influência exercida, entretanto, existe divergência quanto aos setores mais influenciados. Pôde-se perceber que, nas escolas colocadas nos primeiros lugares do ranqueamento, a maioria dos professores concordou que a influência acontece na prática pedagógica,altera a maneira de trabalhar os conteúdos na sala de aula e também influencia a avaliação. Nas escolas colocadas nos últimos lugares, existe uma concordância a respeito da alteração dessa prática pedagógica, mas os profissionais divergem quanto aos setores que recebem tal influência.
Dessa forma, na Escola Urucuia, a maioria dos professores pesquisados afirmou que a mudança acontece na avaliação, enquanto, na Escola São Jorge, as opiniões demonstraram que as alterações ocorrem na maneira de trabalhar os conteúdos em sala, na escolha dos conteúdos e também na avaliação
Podem-se observar tais influências nas repostas dos pesquisados.
Reflete, porque, muitas vezes, o próprio sistema faz com que a gente, em cada professor acabe dando mais, olhe este é matéria de ENEM, eu vou privilegiar esta matéria que cai muito no ENEM, porque ele tem um pro, os alunos, os pais, a própria escola é cobrada pelo resultado no ENEM, a escola vai ser bem vista se ela tiver um bom resultado no ENEM, é assim que ela vai ser mensurada (Flor de Lis).
A gente faz, a gente aplica simulado, a gente procura, os professores procuram trabalhar realmente voltado para questões do ENEM, aproveita as provas dos anos anteriores, trabalha muito redação, a gente faz um preparo assim no terceiro ano é mais focado no terceiro ano entendeu? O primeiro ano a gente não fica muito focado não, este ano a gente tá com uma proposta nova de colocar estes alunos do primeiro ano também caminhando para primeiro, para segundo e no terceiro ano (Açucena).
A mesma opinião foi observada junto aos docentes: em relação à importância da prova do Enem: “Ela deve favorecer no repensar o planejamento da escola a fim de reestruturá-lo e adequá-lo às novas necessidades de aprendizagem do aluno” (Riobaldo). Já outro docente, afirmou que a prova do Enem é utilizada “como modelo de questões a serem trabalhadas com os alunos” (Hermógenes).
Todos os pesquisados concordaram que a prova do Enem influencia na prática escolar, mas afirmaram também que o ranqueamento das escolas também promove alterações tanto nas práticas escolares quanto no currículo conforme se percebe a partir da manifestação de uma gestora pesquisada,
A colocação da escola no ranking atrai alunos tanto que quando inicia o ano letivo aqui a gente recebe ligações pedindo, pessoas particulares pedindo vaga na escola,..., e assim a procura é muito grande graças a Deus, tanto que você vê, eu posso ta te mostrando as listas (Dalia)
Durante a pesquisa de campo foi possível perceber que o ranqueamento produz alterações na prática do professor, no currículo escolar, provoca mudanças na aprendizagem do estudante e acaba por se transformar em estratégia de atração de alunos.
Reflete, porque muitas vezes o próprio sistema faz com que a gente, em cada professor acabe dando mais, olhe esta é matéria de Enem, eu vou privilegiar esta matéria que cai muito no Enem, porque ele tem um pro, os alunos, os pais, a própria escola é cobrada pelo resultado no Enem, a escola vai ser bem vista se ela tiver um bom resultado no Enem, é assim que ela vai ser mensurada. Na captação de alunos influencia assim, na nossa captação de alunos nem tanto, a procura pelo colégio sim, ..., então ai a gente não pode atender todos que viriam pra cá, ... mas os que vêm vêm em cima dessa nota (Flor de Lis).
Desta forma, foi possível perceber através da analise dos dados que a maioria das respostas asseguraram que o ranqueamento produz alterações na prática do professor, no currículo escolar e, ainda, provoca mudança na aprendizagem do estudante.
Foi possível perceber mediante as pesquisas bibliográfica e de campo, que o Exame Nacional do Ensino Médio, se constituiu em uma das principais políticas de avaliação externa da educação no país, diante de sua visibilidade social, sendo realizada por meio de um exame unificado com o objetivo de avaliar a aquisição das habilidades e competências desenvolvidas no ensino médio.
A partir de 2009, quando este programa sofreu algumas alterações, sendo uma delas a possibilidade das notas dos participantes ser utilizada para ingresso no ensino superior provocou uma valorização do exame, fato que pode ser facilmente observado pelo aumento do número de inscritos no exame a partir do ano de sua reformulação.
Outra alteração importante, objeto de nossas pesquisas, foi a decisão do Ministério da Educação por meio do Inep, a partir do ano de 2009, de divulgar a classificação das Escolas que participam do exame nacional de ensino médio, de acordo com as notas obtidas na prova pelos alunos de cada escola, criando desta forma um ranqueamento das mesmas.
Diante desta situação, a análise bibliográfica, documental e a pesquisa de campo demonstraram, que os resultados deste exame e principalmente o ranqueamento divulgado pelo Inep, vem provocando impactos na prática profissional das escolas tais como uma disputa entre as mesmas por uma boa colocação e principalmente mudanças nas estratégias e práticas pedagógicas visando “treinar” os alunos para que obtenham um bom resultado.
A pesquisa evidenciou que a proposta do Ministério da Educação em promover uma avaliação externa do ensino médio, com o objetivo de avaliar se os alunos concluem este nível de ensino com as competências e habilidades propostas, provocou alterações na dinâmica escolar visando um bom resultado por parte dos alunos que irão fazer a avaliação o que influencia diretamente as escolas, uma vez que, mediante uma boa classificação no resultado lhe dará visibilidade social. Sendo assim, uma boa classificação é importante para desenvolver estratégias para captação de novas matriculas de alunos e até de recursos financeiros
A partir de 2015, as novas diretrizes implantadas pelo Fundo de Financiamento do Ensino Superior (Fies), que financia o ensino superior aos alunos que não possuem condições financeiras para cursar tal modalidade, determinaram que, para ter acesso a este financiamento o candidato deverá comprovar que realizou o Exame Nacional do Ensino Médio, obteve média acima de 450 pontos e não zerou a redação. A necessidade de atender a estes requisitos, provavelmente servirá também como mais um incentivo aos alunos que almejam este financiamento a procurarem se matricular em escolas bem ranqueadas pelo Enem, o que vai mais uma vez comprovar a influencia desta classificação nas praticas e currículos escolares, conforme já demonstrado na pesquisa.
Desta forma a proposta de Luckesi (2002), de que a avaliação deve ser colocada a serviço da aprendizagem não funciona nos casos do exame do Enem porque nesta situação a aprendizagem esta colocada à mercê da avaliação, ou seja, do resultado das notas do Enem e de seu ranqueamento das escolas.
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